sábado, 29 de dezembro de 2007

Tons que tocam


Intérprete: Paula Oliveira e Bernardo Correia


Tema: Indíos da Meia Praia

Autor: Zeca Afonso

sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Partir as correntes

“A liberdade é a possibilidade do isolamento. És livre se podes afastar-te dos homens, sem que te obrigue a procurá-los a necessidade de dinheiro, ou a necessidade gregária, ou o amor, ou a glória, ou a curiosidade, que no silêncio e na solidão não podem ter alimento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo.”

in Livro do Desassossego
De Bernardo Soares


Por vezes sinto que tudo o que me rodeia me aprisiona. E quando isso acontece, tiro uns dias para dar uma escapadinha, sozinho (ou antes, só comigo), para me voltar a sentir livre no sentido mais amplo da palavra… Talvez Bernardo Soares (ou Fernando Pessoa) tenha razão… Fica aqui registado, para não me esquecer, que mais dia, menos dia, parto (de novo) à procura dessa liberdade, à minha procura, e à procura do meu Norte. E se esse dia não pode ser hoje… Sei que amanhã faltará menos um dia…

sábado, 8 de dezembro de 2007

Fases Negras

São mágoas, rancores, revoltas e tormentas que me enchem. São sofrimentos de vários dias acumulados. Pressões, responsabilidades, prazos…
Enfim, é a vida toda a fervilhar e eu inquietamente desgastado, sem a conseguir controlar.
E nervoso vou mudando. Não me consigo adaptar, não consigo encaixar em tudo o que se move.
E deste caos surgem frustrações e problemas.
E deste caos surgem incertezas e indefinições.
E deste caos surgem acesas discussões interiores.
E noto que dentro de mim à refracções. Dentro de mim à dissidências, conflitos, rebeldias e contradições que me agitam por dentro, que vivo plenamente.
E toda esta discórdia que custa a caber num ser só, pinta-me por dentro de preto e de cinzento, tingindo o mundo que vejo.
Olho-me e vejo-me hostil, cerrado, avesso, aparentemente indiferente, alheado, mas, em boa verdade transtornado, debilitado, inadaptado.
Olhando-me, não me reconheço, eu não sou este ser amargo…
Recolho-me, encolho-me, levanto a guarda tão alto quanto consigo, e protejo-me.
Mas esta fraca protecção, a mais forte que sou capaz, chama-se vulnerabilidade, e tudo o que acontece me ataca, e até a leve chuva fere.
É frágil a corda que impede o nosso mundo de desabar.

sábado, 1 de dezembro de 2007

Tons que tocam



Intérprete: Madredeus

Tema: Guitarra

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Uma vez cansado, ou se desiste ou se resiste.

"Foi um homem cansado que montou o cavalo e se deixou arrastar, abúlico, à volta do picadeiro, mas depois aprumou-se (ao ocorrerem-lhe determinados pensamentos relacionados com o Povo) cheio de energia, puxou as rédeas, chamou a si o cavalo e deixou-o banhado em suor; foi um homem novo e recomposto que saiu do picadeiro."

in Histórias de Almanaque
Bertold Brecht

terça-feira, 13 de novembro de 2007

O Mendigo

O mendigo estava sentado no chão, encostado a uma árvore do jardim. Olhou nos olhos do seu cão e perguntou-lhe:
- Como é que eu posso ser mais vadio do que tu?... - O cão ladrou. O mendigo fez-lhe uma festa na cabeça. Depois olhou pelo canto do olho para o vendedor de castanhas, apetecia-lhe comer uma dúzia de castanhas, mas resistia à tentação. Depois, voltou a olhar para o cão e disse-lhe:
- Bem, vou trabalhar, se não, não teremos o que dividir ao jantar... Guarda as nossas coisas. - e dito isto levantou-se, depois mirou as pessoas que atravessavam o parque e decidiu abordar um homem de fato que vinha na sua direcção.
- Desculpe...
- Não me diga nada que hoje acordei em dia não. - Disse o homem em tom ríspido.
- Eu há sete anos que acordo em dia não. - O homem deteve-se, olhou para o mendigo e decidiu dar-lhe as três moedas que tinha no bolso. O mendigo sorriu e agradeceu. De seguida dirigiu-se a duas raparigas, provavelmente estudantes, e pediu:
- Por favor, ajudavam-me com qualquer coisinha? - Tinha por convicção que o diminutivo fazia com que custasse menos às pessoas dar-lhe a esmola. Uma das raparigas empinou o nariz e disse resoluta:
- Eu até lhe dava sabe?... Mas não posso, se não atraso a revolução! - O mendigo ficou a atónito. Pensou: "Que consciência social...", e voltou para perto do cão.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Desencontros

Eu era pó, fui terra, e depois pedra, e vi-te no céu. Tu eras estrela, e tu, não me viste, e eu ,enquanto brilhavas, discreta, sózinha, entre todas as estrelas, num enorme momento só meu, apaixonei-me por ti...

E depois fui lume, fui chama, fui paixão, e tu desaparecias com o nascer do dia, e aparecias com a noite. E eu ardendo tornei-me cinza, pó de novo, e com o vento fui poeira. Até que, voltei a assentar, e quando as chuvas vieram, fui um riacho, depois rio, e mais tarde mar, e do cimo das ondas olhava para ti à noite, e tu, nunca me viste...

E tudo o que eu queria era poder chegar mais perto de ti, poder falar contigo, conhecer-te, passar a eternidade toda a contemplar-te, e fazer tudo para te ver feliz. Por isso, quando amanheceu e tu desapareceste, eu aproveitei uma onda maior e pus-me ao sol no areal de uma praia, e como planeado, evaporei. Quando anoiteceu eu era nuvem, e era a felicidade por estar tão perto de ti quanto me era possível, e contemplei-te durante muitas noites, durante todas as noites, e tu, nunca reparaste em mim...
E hoje reparei que tu já não és só uma estrela, és parte de uma constelação, e eu sou ciúme. E tu és amor, e eu sou respeito. E tu és proíbida, e eu cobarde. E tu não me vês, e és estrela e nunca poderei chegar mais perto de ti...
E hoje eu sou a trizteza toda, a precipitação...
Hoje sou lágrima...
Mas volta e meia, voltarei a comtemplar-te quando a noite cair.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Masterpiece ( Fascículo II )

Afonso permaneceu alguns minutos quieto, imóvel, estático, em paz com todas as coisas, olhando fixamente para a sua personagem ainda vazia.
Depois, imaginariamente, disse:
- Serás uma mulher... Uma mulher inteligente e culta. Serás perspicaz... - pensou mais um pouco e continuou.
- Serás discreta... que é uma das características que mais aprecio nas pessoas. E terás uma elegância invejável. E como me parece que fumar é um acto socialmente elegante, e porque me apetece ter companhia para fumar um cigarro, permite-me ser déspota, e determinar que fumarás. - E dito isto, Afonso sentou-se no sofá, retirou dois cigarros do maço de tabaco, um real e um imaginário, e estendeu o cigarro imaginário à sua personagem.
- Fumas?
- Sim, agradeço. E que mais serei? - Afonso emprestou o seu isqueiro de prata à personagem. Quando esta lho devolveu, viu na transparência uma mão delicada, com dedos finos e compridos e unhas cuidadas, mas não revelou a sua visão à personagem. Acendeu o cigarro, deu um trago profundo, fez um compasso de silêncio para permitir que as ideias voltassem a organizar-se, até que por fim, de olhos fixos no fio de fumo que lhe desfiava o cigarro, respondeu:
- Tenho uma dívida grande com Deus... Vou pagá-la a ti, esperando que o Altíssimo se dê por pago... Terás livre-arbítrio, serás tu a formar a tua personalidade, partindo do que já determinei.
- Isso condiciona-me, o que já determinaste. Mas agradaram-me os traços da minha personalidade que acabaste de desenhar. Ainda assim... Estou também, e sobretudo, condicionada pelo teu livre-arbítrio, pelo que o teu livre-arbítrio me permitir, uma vez que o meu livre-arbítrio pertence ao teu por inteiro.
- Sim, é verdade. - Afonso voltou a deitar-se no sofá, meditando sobre o que a sua personagem lhe tinha acabado de dizer. Deu um último bafo num resto de cigarro, que já se tinha transformado quase por completo em fumo e cinza, apagou-o, e disse resoluto:
- Pois bem!... Serei esquizofrénico... Parece que é pré-requisito para se ser um grande génio. Ciente das minhas comedidas capacidades, não serei esquizofrénico aspirando vir a ser um grande génio, será apenas uma tentativa de te libertar... Ainda que a minha esquizofrenia seja também ela imaginária. Enfim... Quero dizer... Esforçar-me-ei por te libertar.
- Está bem. Esse esforço basta-me. E fisicamente? Como serei? - perguntou a personagem.

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Masterpiece ( Fascículo I )

Afonso dirigia-se para casa, caminhando calmamente pelas ruas da capital. A noite tinha sido agradável, passada com dois velhos amigos de faculdade, no Procópio, lá no jardim das amoreiras, bar de que se tinha recentemente tornado cliente habitual. Correram pela mesa histórias antigas, nostalgias e gargalhadas, que nasceram de sementes plantadas noutros tempos, e vários copos de cerveja belga, porque os gostos e os hábitos daqueles amigos, outrora rapazes, se tinham refinado, como convinha aos maduros cinquenta anos que os três já tinham. E foi essa bonita idade que os fez sentirem-se cansados, por volta das duas da madrugada e uma frase chave de Afonso (“Bem, vamos lá que amanhã trabalho...”) que os levou de volta para os respectivos aconchegos caseiros...

Afonso mentira... Não trabalhava no dia seguinte. Nem sono tinha ainda, mas de repente foi conquistado por uma vontade de ficar sozinho, sozinho não... de estar apenas consigo mesmo, que sozinho ninguém gosta de estar, e servira-se daquela mentira para atingir os seus objectivos, mas já lhe dizia o avô: “meu filho, quem não mente, quem não rouba, nem herda, nunca sai da merda...”. Afonso não estava na merda, longe disso, mas a vida também lhe foi ensinando que a mentira também o podia tirar de outros sítios mais cómodos.
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Chegou a casa, pendurou o casaco no cabide, descalçou-se, e acendeu apenas o candeeiro de modo a pairar na sala uma luz suave. Depois colocou na aparelhagem Miles Davis, e deitou-se comodamente no seu grande sofá. Acendeu um cigarro e deixou os seus pensamentos à deriva, guiados pelo Jazz e pelo prazer sublime daquele cigarro naquele exacto momento.
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- Inventa-me... – sussurrou-lhe uma voz por ele imaginada.
- Invento-te?... – respondeu Afonso imaginariamente. Mas quem és tu?
- Eu não sou... Eu queria ser. Mas para isso preciso que me cries, que me dês vida. Sou uma personagem. Um nada enquanto não fizeres de mim alguém.
- Uma personagem...? Engraçado... E queres ser uma personagem de quê?...
- Tu és escritor... Queria ser personagem de um dos teus livros, de um romance! Queria ser a personagem principal!
- Que ânsia de fama...
- No anonimato ando eu há tempo de mais. Faz de mim uma estrela!
- Duvido que o meu talento seja suficiente para realizar as tuas aspirações. Mas posso tentar ajudar-te... Darei o meu melhor... E és uma personagem masculina ou feminina?...
- Como te disse, ainda não sou... Terás de brincar de Deus, terás de ser o meu criador... – Afonso manteve-se em silêncio, reflectindo sobre o que a personagem imaginária imaginariamente lhe tinha dito. Deixou fermentar uma ideia secreta e de seguida respondeu:
- Pois bem... Serás uma personagem feminina. Deita-te então na chez long... Deixa-me olhar a tua inexistência para te imaginar. – e a personagem deitou-se, pousando para a imaginação de Afonso.
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* Os fascículos desta versão sairão todas as quartas-feiras, salvo se a inspiração do autor faltar ao combinado.

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Dueto escrito


Convidei a rapariga que toca piano para escrevermos juntos uma história, para que pudessemos diluir nessa história as nossas versões da vida, das pessoas e do Mundo, misturando escritas, imaginações, sonhos, inocências, experiências e cogitações. A rapariga que toca piano, amavelmente, aceitou o convite, e assim soaram os primeiros acordos deste dueto escrito...
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(Aguardo com expectativa pelos próximos acordos)

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Entre as margens do problema de expressão


Disse-lhe ao ouvido, enquanto atravessavam o Tejo, na ré de um cacilheiro:

-“Finge que não me conhecias,
Que por acaso na rua me viste
E sem escolha me escolheste
E sem escolha me elegeste
Tua
De entre todas as mulheres.
Finge que ao ver-me os olhos te perdeste
E ao dares-me a mão descobriste que em mim estavas perdido
Mas que em mim estava o caminho
E me disseste:
- Vem. Quero encontrar-me.
Finge que ao ver-me nua
Nu te viste,
E tão tu e exposto te sentiste
Que com a minha pele te cobriste
Que a minha pele vestiste
Sabendo que tua
Era a minha pele.
Finge que me quiseste tanto que impotente te sentiste
Ante um desejo tão profundo e desmedido
Que insaciados ficaram os sentidos,
E que o teu corpo se tornou súplica
Sofreguidão
Fome do meu
....
Finge que sem escolha me escolheste.”*


- Finge que sentes o que em mim despertaste. E desculpa se não são minhas as palavras que te digo. Sempre tive algumas dificuldades de expressão. Precisei destas palavras para te tentar explicar que, por minha incapacidade natural, expresso-me em prosa mas amo-te em verso.


*Poema escrito por Encandescente

sábado, 18 de agosto de 2007

"Só de sacanagem"



Há pessoas que escrevem e/ou falam de um modo que nos faz entender a mensagem que nos querem passar com a alma...

Texto de Elisa Lucinda
Na voz de Ana Carolina

Foi um dos meus irmãos mais velhos que me mostrou este vídeo, também ele, volta e meia, me leva a descobrir novos Mundos, e por isso lhe agradeço.

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

A Boneca de Pano

- Pai, tenho fome… – o pai sorriu, a pequena dizia sempre a mesma frase quando chegava da escola. Quando vinham a brincar no caminho para casa o pai já vinha a pensar fazer um bolo com a Joana e preparar-lhe um copo de leite, para matar a fome da filha de quatro anos. Enquanto a Joana tirava a mochila das costas o pai foi à cozinha e reparou que não havia quase nada no frigorífico e na despensa, o que era habitual, mas não tinha nada do que precisava para fazer o lanche da filha.
- Joana, vamos às compras. – Joana correu contente para a porta. Adorava ir ao supermercado.
Quando chegaram ao supermercado o pai tirou a carteira do bolso de trás e contou o pouco dinheiro que tinha e começou a pensar nas coisas que tinha mesmo que comprar. Joana gritou:
- Não me apanhas! – O pai, respondendo-lhe com um sorriso, fingiu que ia começar a correr atrás da menina e deixou-a ganhar uma pequena vantagem para que a brincadeira durasse um pouco mais. Depois, desatou a correr para a apanhar, e quando finalmente conseguiu, depois de terem corrido todo o supermercado, entre prateleiras e carrinhos de compras, o pai pegou na filha ao colo e fez-lhe cócegas. De seguida foram ambos buscar dois pacotes de leite, um pacote de farinha, um pacote de arroz, e… e mais nada, porque o pai não tinha dinheiro para mais.
Então, o pai pôs a pequena Joana às cavalitas e dirigiu-se à caixa. Quando chegou colocou os quatro produtos no tapete rolante e reparou que Joana vinha abraçada a uma boneca de pano que tinha retirado rapidamente e sem o pai se aperceber de uma prateleira. Joana olhou para o pai e disse:
- Pai, leva… - O pai colocou Joana no chão, e olhando para a filha que abraçava fortemente a boneca disse-lhe:
- Joana, não podemos levar… Não temos dinheiro, olha o preço, é muito cara… - Então começaram a escorrer lágrimas dos olhos de Joana, e a pequena abraçou a boneca com mais força, enquanto chorava em silêncio. O pai pediu então a boneca a Joana para a ir colocar na prateleira devida, Joana deu-lha, e quando viu o pai afastar-se com a boneca não conseguiu suster o som do seu choro.
Quando se deitou, a esposa perguntou-lhe o que se passava, porque ele e Joana estavam tão tristes, e quase não falaram ao jantar. O pai deixou escorrer uma lágrima e contou à mãe. Depois levantou-se, vestiu-se e saiu de casa. Foi a um contentor onde as pessoas colocavam roupa velha e arranjou pano e uns sapatos de bebé. De seguida procurou em vários contentores do lixo uma peruca porque o Carnaval tinha sido poucos dias antes. E quando conseguiu reunir tudo o que precisava voltou a casa.
Eram duas da manhã quando se sentou na mesa da sala e debaixo da fraca luz de um candeeiro abriu a caixa de costura e começou a cortar tecido, a cozer com agulha e linha, e quando o a boneca estava quase concluída cortou um pouco da peruca que tinha encontrado e foi buscar um pente que a esposa normalmente usava para se pentear, e tentou dar forma ao emaranhado de fios. Por último, coseu a peruca à cabeça da boneca. Então, encostou a boneca ao pé do candeeiro e ficou o tempo de um cigarro a admirar o seu trabalho, contente consigo próprio.
Antes de se deitar passou no quarto de Joana e colocou a boneca entre os braços da pequena sem a acordar, deu-lhe um beijo na testa e foi-se deitar.

Joana sentiu o beijo na testa e abriu os olhos lentamente. Só viu o pai a sair do quarto, mas sentiu que estava abraçada a alguma coisa e acendeu o candeeiro da sua mesa-de-cabeceira. Quando viu a boneca Joana fez um enorme sorriso, abraçou a boneca e correu para o quarto dos pais. Quando chegou abraçou o pai e deu-lhe um beijo na testa e a mãe disse-lhe:
- Está tarde Joana. Temos de dormir… Dorme aqui connosco. – E Joana deitou-se no meio dos pais. Os pais adormeceram rapidamente, Joana ficou a admirar a sua boneca e a pensar que nome lhe daria até ser vencida pelo cansaço.

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

A Nódoa de Vinho Tinto

- Mas, há quanto tempo se separaram?...
- Há quase dois anos e meio… – Respondeu com uma saudade enorme estampada no rosto.
- E ainda a amas? – Perguntou o amigo, pensando que já sabia a resposta.
- Pergunta complicada… Se amar há-de passar-me… O tempo tudo cura…
- Há um provérbio que diz: “a nódoa de vinho tinto, com vinho branco se tira”. Não estarás a precisar de andar com outra pessoa para a esquecer?
- Hum… Não concordo nada com isso… Isso não é bom para ninguém… Para a pessoa que iria usar seria péssimo, porque não sentiria por ela qualquer coisa significativa. Para mim também não seria bom, porque não amaria essa pessoa, mas sim outra… Não… Não faz sentido… A aspirina cura dores de cabeça, mas não cura dores de dentes… Houve um curto momento de silêncio. Depois, com um sorriso disse:
- E já experimentei isso do vinho branco… num dia em que num jantar formal entornei um copo de vinho tinto na minha melhor camisa. A nódoa não sai… Fica menos visível, mas continua lá… – E alargou o sorriso ao lembrar-se do tamanho da nódoa, e do quão chateado tinha ficado por tê-la feito.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Politicamente? Canhoto...

“E eu pergunto aos economistas políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infância, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico?”
Almeida Garrett

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

O Homem Bom/O Homem Mau

Já vi quem sustentasse que o homem é um ser intrinsecamente bom:

Mencio Mong Tsé (371 A. C.- 289 A.C.) sustentava que os seres humanos são naturalmente bons e agem naturalmente de maneira moral. São dotados de compaixão e da capacidade de distinguir o bem do mal e, por isso o mal é resultado de influências externas.

Rousseau sustentou que o homem é bom por natureza, mas a sociedade corrompe-o.

Já vi quem defendesse o contrário… que o Homem é um ser mau por natureza:

Han Fei Tsé (280 A.C. - 233 A.C.) advogava que os seres humanos são naturalmente maus e precisam da educação e da pressão politica para se tornarem bons.

Hobbes formulou a célebre frase: “Homo homini lúpus” – “o homem é o lobo do homem”.

Contudo, não vejo completa razão em nenhuma das posições que se debatem. Segundo a minha (ingénua) forma de ver o Mundo, o Homem é por natureza neutro, e durante a vida forma a sua personalidade, que dependerá do meio em que se encontra e da sua forma de reagir a esse meio.

O Matemático

Os meus sonhos, como os de toda a gente, traduzem-se em certos resultados, em determinados fins que desejo alcançar.
Assim sendo, todos os dias equaciono os meios que preciso usar ou de poder dispor para alcançar ou cumprir os meus sonhos.
Matematicamente, talvez se possa dizer que “x”, o que sonho, há-de ser igual a “y” mais ou menos “z” (ou seja, x = y +/- z).
Por exemplo, e olhando as coisas de um modo simplista, o sucesso profissional que desejo, teoricamente, há-de ser igual a: dedicação + paixão pela profissão que vier a exercer. Logicamente, a equação pode, ou mesmo deve, ser aumentada.
Contudo, e é aqui que tudo se complica, equaciono todos os dias o que fazer em relação a ti… Todos os dias tento resolver a nossa equação. Penso, reflicto, vejo, revejo e volto a revê-la , e nesta equação, onde entram já constantes e variáveis, perco-me, e não consigo atingir qualquer resultado. E sempre que me perco volto incansavelmente ao início e a dada altura reparo que houve um menos ou um mais que me passou ao lado, e que tudo o que fiz para a frente está errado. Recomeço…
Equaciono apenas, penso, pondero, planeio, imagino, sonho, sem nunca agir antes de chegar ao resultado certo e indubitável da equação. No entanto, tenho consciência que em equações “deste calibre” não se consegue chegar a um resultado rigoroso, é possível apenas, e quando muito, chegar a um valor aproximado.
Assim sendo, chego à conclusão que equacionamos demais…
Dou por mim sentado à secretária dos meus pensamentos, rodeado de folhas com números, cálculos, riscos e rabiscos, e reparo que do que equaciono tão poucas equações consigo resolver, e tanta coisa deixei por cumprir, por não ter resultados rigorosos que me dessem uma base fiável para agir…
E dou por mim revoltado com tudo isto, amachuco todos os papéis furiosamente e atiro-os para o lixo dos meus pensamentos, porque a minha última equação deu um resultado indesejado, mas certo… - diz que enquanto estás aí, eu estou aqui longe, a equacionar o que me dirias se te dissesse… a imaginar como reagirias se te sorrisse… o que me responderias se te convidasse… como seria se te vivesse, a fingir que te vivo, a ponderar como te vivia, como viveríamos…
Chega de equações!!!
Vou viver-te!

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

A beleza da diferença

- Somos diferentes... - disse-lhe sorrindo.
- Sem dúvida...
- E eu adoro essa diferença toda que entre nós existe...
- Porquê?...
- Porque me descreves tudo o que sentes que eu não sinto, a tua forma de ver o Mundo tão diferente da minha, os sítios onde estiveste que eu nunca vi, os sabores que provaste que eu nunca senti, as experiências que viveste, que foram também, logicamente, diferentes das minhas, a tua maneira própria e única de pensar e viver... e nisto tudo acabo sempre, como agora, a olhar as estrelas e a imensidão do céu, e a pensar que ainda tenho tantos sítios, tantos sentimentos, tantos livros, tantas formas de pensar, tantos pontos de vista, e tantas maneiras de ser para descobrir, e constato que tenho este universo todo para explorar... Tenho este universo todo para aprender... Tenho este universo todo para ser...
...

Tenho este universo todo para viver!

terça-feira, 7 de agosto de 2007

Notas sobre auto-motivação

Todos passamos por fases menos fáceis na vida, períodos mais complicados, em que somos postos à prova, colocando-nos a vida perante adversidades que por vezes nos fazem duvidar das nossas capacidades, da nossa força, e que nos podem levar a pensar que não conseguiremos ultrapassar certo obstáculo, e que mais vale desistir.
Há pouco tempo passei uma fase dessas, e por ter a sorte de estar rodeado de pessoas (e livros) interessantes, aprendi algumas coisas que me ajudaram a ter força e que me motivaram. Para não me esquecer do que me ensinaram deixo aqui esta versão dos factos (estas [6] notas sobre auto-motivação), esperando que ela também seja útil a alguém que, por acaso, a leia.

1. À mesa de um café, falava com um dos meus irmãos mais velhos, sobre a fase que enfrentava, e as dificuldades que estava a ter em ultrapassar os obstáculos com que me deparava. Ele sorriu e começou a contar-me que em Maio de 1987 o Futebol Clube do Porto jogou a final da Taça dos Campeões, em Viena, contra o FC Bayern München, o "gigante" bávaro. Ao intervalo o Futebol Clube do Porto perdia por 1-0. Durante o intervalo Artur Jorge juntou-se com os seus jogadores no balneário e passou quase a totalidade do intervalo num tenso silêncio. Antes de os jogadores saírem do balneário para voltarem ao campo, Artur Jorge disse-lhes apenas quatro palavras: “Amanhã não há mais”.
Talves por sentir que os sonhos têm um limite de tempo máximo para serem alcançados os jogadores do Futebol Clube do Porto fizeram uma segunda parte brilhante, Madjer empatou o jogo aos 77 minutos, com um golo extraordinário de calcanhar, e quatro minutos depois Juary fez o segundo golo para o Porto, golo que conduziu o clube português à vitória da Taça dos Clubes Campeões Europeus.
O que desejamos tem um prazo para ser alcançado, não devemos perder tempo, e não nos podemos intimidar por dificuldades, é necessário ter presente que amanhã pode já não ser possível lutar pelos nossos sonhos.

2. Na mesma ou noutra conversa sobre o mesmo assunto, o meu irmão disse-me que alguém que lhe é muito querido um dia lhe tinha ensinado que: “o único sítio onde sucesso vem antes do trabalho é no dicionário”.

3. Num livro que li, encontrei uma frase curiosa, cuja autoria é atribuída a Nietzsche e que dizia que: “A vontade não tem poder para querer no passado.”

4. Saint-Exupéry conta no seu livro Terra dos Homens a história de um seu amigo e colega que se chamava Guillaumet, e que certo dia desapareceu durante uma travessia dos Andes. Ao cabo de 50 horas e apesar das buscas, nas quais participaram dois aviões (um dos quais pilotado por Saint-Exupéry) não havia sinal do piloto desaparecido, e sem esse sinal a esperança de o encontrar com vida ia também morrendo. As buscas pararam ao fim de cinco dias. Sete dias depois do desaparecimento do pequeno avião de Guillaumet, “enquanto [Saint-Exupéry] tomava um almoço frugal entre dois voos, num restaurante de Mendonza, um homem empurrou a porta e gritou, oh, coisa pouca: «Guillaumet....... vivo!.... » …”
Lembro-me de antes de ter lido o livro ter visto um pequeno filme sobre esta história, contada por Saint-Exupéry, no Futuroscope. No filme via-se Guillaumet a caminhar nos Andes e de cada vez que dava um passo repetia em voz alta para si próprio: “je marche, je marche…”. No livro “Terra dos Homens” Saint-Exupérie refere que Guillaumet lhe confidenciou que nessa altura pensava que “a salvação é dar um passo. Mais um passo. É sempre o mesmo passo que se recomeça”.
E assim me ensinaram Guillaumet e Saint-Exupéry que não podemos parar de andar (ou correr se possível) em direcção ao que realmente queremos.

5. Philips Brooks escreveu um dia: “Nunca ore suplicando cargas mais leves, e sim ombros mais fortes”.

6. Bertold Brecht escreveu um dia:
“Há homens que lutam um dia – e são bons.
Há homens que lutam um ano – e são melhores.
Há homens que lutam muitos anos – e são muito bons.
Porém há homens que lutam toda a vida – estes são os imprescindíveis.”

Eis o que apreendi. Penso que reflectir sobre o que ficou dito pode ajudar na nossa auto-motivação.

Um agradecimento especial ao meu irmão, por raro ser o dia que estamos juntos que não me ensine qualquer coisa, que motiva a apreender cada vez mais, e que neste caso concreto, mais do que apenas por palavras me ensinou pelo exemplo, à semelhança do que fizeram os meus outros irmãos.

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

O porquê d'esta versão dos factos


Um dia li... :

"Escreve!

Senta-te diante da folha de papel e escreve. Escrever o quê? Não perguntes. Os crentes têm as suas horas de orar, mesmo não estando inclinados para isso. Concentram-se, fazem um esforço de contensão beata e lá conseguem. Esperam a graça e às vezes ela vem. Escrever é orar sem um deus para a oração. Porque o poder da divindade não passa apenas pela crença e é aí apenas uma modalidade de a fazer existir. Ela existe para os que não crêem, como expressão do sagrado sem divindade que a preencha. Como é que outros escrevem em agnosticismo da sensibilidade? Decerto eles o fazem sendo crentes como os crentes pelo acto extremo de o manifestarem. Eles captarão assim o poder da transfiguração e do incognoscível na execução fria do acto em que isso deveria ser. Escreve e não perguntes. Escreve para te doeres disso, de não saberes. E já houve resposta bastante. "

[...] 

"Porque escrevo? Escrevo para criar um espaço habitável da minha necessidade, do que me oprime, do que é difícil e excessivo. Escrevo porque o encantamento e a maravilha são verdade e a sua sedução é mais forte do que eu. Escrevo porque o erro, a degradação e a injustiça não devem ter razão. Escrevo para tornar possível a realidade, os lugares, tempos que esperam que a minha escrita os desperte do seu modo confuso de serem. E para evocar e fixar o percurso que realizei, as terras, gentes e tudo o que vivi e que só na escrita eu posso reconhecer, por nela recuperarem a sua essencialidade, a sua verdade emotiva, que é a primeira e a última que nos liga ao mundo. Escrevo para tornar visível o mistério das coisas. Escrevo para ser. Escrevo sem razão."

Vergílio Ferreira, in 'Pensar'

E eu escreverei esta versão dos factos por tudo isto,  e escreverei sobretudo apenas por escrever.